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#2 Pais cuidadosos ou amantes interesseiros? A novela dos aracnídeos que cuidam de seus filhos

junho 3, 2019 em 3:15 , 5 comentários

Na notícia de hoje, contarei outra pesquisa feita por ex-colegas do laboratório no qual eu fiz o doutorado. Este foi o trabalho de iniciação científica da Louise M. Alissa, no qual ela investigou o porquê de apenas alguns machos de uma espécie de opilião cuidarem da prole. Segue a notícia:

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Cuidado paternal: quando machos cuidam dos filhotes

Fêmeas investem muito mais na produção de gametas do que machos e por isso, tradicionalmente, esperamos que fêmeas se dediquem mais em cuidar dos filhotes. Porém, o cuidado paternal é encontrado em diversas espécies. Machos que exibem cuidado paternal gastam tempo e energia cuidando de filhotes, por isso gastam menos tempo procurando fêmeas para copular. Assim, o cuidado paternal deve evoluir somente quando os ganhos em cuidar dos filhotes são maiores que os custos para os machos.

Custos e benefícios de cuidar de filhotes variam com as características da espécie e com características individuais de cada macho. Em espécies em que machos tem haréns, cuidar de filhotes diminui o tempo que os machos poderiam investir em  impedir que suas fêmeas copulem com outros machos. Nesses casos, espera-se que não haja cuidado, ou que só a fêmea cuide. Além disso, espera-se que machos atraentes cuidem menos da prole, já que são eles que conseguem atrair várias fêmeas e formar haréns. Por outro lado, machos pouco atraentes dificilmente vão conseguir muitas parceiras, por isso espera-se que estes machos dediquem mais tempo cuidando dos filhotes.

Opiliões são aracnídeos, primos das aranhas, que não tem veneno e são inofensivos para os seres humanos. Na espécie de opilião Serracutisoma proximum, machos mais atrativos defendem territórios. As fêmeas escolhem o macho, copulam com ele, deixam os seus ovos no território do macho e ficam ali cuidando deles. Machos com território mantêm haréns e patrulham o território para evitar que machos solteiros copulem com as fêmeas. Curiosamente, alguns machos donos de haréns são observados tomando conta de ovos quando a mãe não está por perto.

Para esclarecer este comportamento dos machos, os cientistas buscaram responder as seguintes dúvidas:

1) será que o comportamento cuidar ou não da prole está relacionado à atratividade dos machos?

2) quando os machos cuidam, a mortalidade dos ovinhos diminui?

3) ter dúvidas sobre à paternidade dos ovos afeta o cuidado paternal?

Macho de Serracutisoma proximum tomando conta dos ovos deixados por uma das fêmeas de seu harém. Créditos da imagem: Louise M. Alissa

Como eles fizeram?

Os cientistas fizeram um experimento em campo, no qual manipularam os indivíduos na natureza. Eles encontraram 35 haréns nos riachos onde esses animais são encontrados na floresta. Em cada harém, os cientistas identificaram as fêmeas que estavam com ovos e removeram uma delas. Eles então observaram:

- se o macho dono do harém foi cuidar destes ovos

- se o macho era atrativo ou não (ou seja, se ele costumava atrair muitas fêmeas)

- se o macho dono do harém protegia os ovos de possíveis predadores

- se machos que tinham mais certeza que eram pai dos ovos cuidavam mais. Como medida de “certeza de paternidade”, os cientistas utilizaram a frequência com que os machos ficavam perto das fêmeas do harém. A lógica é: se o macho estava sempre de olho, ele sabe que nenhum outro macho se aproximou das fêmeas de seu harém e que ele é o pai.

O que eles descobriram?

A maioria dos machos donos de harém se colocou sobre os ovos quando a mãe foi removida, indicativo de cuidado paternal. Porém, eles não foram muito bons cuidadores.

Primeiramente, o número de ovos que morreram com ou sem os machos por perto foi o mesmo. Este foi o primeiro resultado inesperado, já que, em um estudo anterior, cientistas perceberam que a presença de machos diminuiu a mortalidade dos ovos.

Em segundo lugar, quando novas fêmeas chegaram ao harém, estes machos permitiram que elas comessem os ovos que eles supostamente estavam cuidando. Em seguida, eles copulavam com elas.

Por fim, machos mais atraentes ou que tinham menores certezas de paternidade passaram menos tempo cuidando dos ovos do que machos menos atraentes ou que tinham mais certeza de paternidade. 

Macho de Serracutisoma proximum tomando conta dos ovos deixados por uma das fêmeas de seu harém. Créditos da imagem: Louise M. Alissa

Por que isso é importante?

Entender os custos e benefícios do comportamento dos indivíduos é crucial para entendermos como eles evoluíram. O estudo feito com o opilião S. proximum trouxe importantes esclarecimentos sobre a evolução do cuidado paternal. Na espécie estudada, machos cuidam dos ovos, mas a qualidade do cuidado depende do quanto o macho está ganhando com isso. Se o macho é muito atraente, ou se o macho não tem certeza que é o pai dos ovos, ele prefere investir em conseguir novas parceiras ao invés de cuidar. Além disso, caso machos tenham a chance de ter mais filhotes com outras fêmeas, eles não se importam em sacrificar os filhotes que já existem. Assim, dependendo das características do macho e da situação na qual ele se encontra, encontraremos bons ou maus pais na natureza. Na espécie estudada, cuidar ou não é opcional para os machos e depende das condições atuais. Em outras, o cuidado paternal é crucial para que os filhotes sobrevivam, por isso evoluiu e é obrigatório. Podemos esperar que o cuidado paternal evolua e se estabeleça somente quando cuidar da prole aumenta o sucesso reprodutivo dos machos.

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Para acessar o artigo científico, clique aqui. Autores do artigo: Louise M. Alissa, Danilo G. Muniz e Glauco Machado.


5 comentários - #2 Pais cuidadosos ou amantes interesseiros? A novela dos aracnídeos que cuidam de seus filhos

Carolina - junho 3, 2019 em 4:27
Muito interessante!
Wagner - junho 3, 2019 em 10:32
Olá Erica,
Quais são os cuidados que os ovos de opilião necessitam pra não morrer?
Wagner - junho 3, 2019 em 10:32
Olá Erica,
Quais são os cuidados que os ovos de opilião necessitam pra não morrer?
Erika M. Santana - junho 6, 2019 em 2:34
Wagner, os ovos de opilião desta espécie são envoltos em um muco deixado pela mãe (uma espécie de geléia). Esse muco "cola" os ovos na folha e evita que eles ressequem e morram. Fora o ressecamento, a principal causa de morte de ovos de opilião são os predadores, como outros opiliões, vespas, gafanhotos, grilos e aranhas. Por isso o cuidado parental provido pela mãe é tão importante, pois ajuda a afastar esses predadores.

No caso das centenas de outras espécies de opilião que existem, os cuidados que os ovos precisam variam bastante. Espécies diferentes tem diferentes formas e locais de deixar os ovos, que podem estar mais ou menos expostos. Além disso, há espécies em que só a mãe cuida, outras em que só o pai cuida e outras em que nenhum dos pais cuida dos ovos.
Wagner - junho 8, 2019 em 10:05
Valeu! :)

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